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03 dezembro 2018
16:53
Redação

António Zambujo: "o português é a língua mais bonita"

António Zambujo: "o português é a língua mais bonita"
Entrevista ao cantor alentejano, a propósito do seu novo álbum "Do Avesso".

"Do Avesso" é o novo álbum de António Zambujo, para o qual reuniu um trio de produtores, uma espécie de conselho, com os arranjadores Filipe Melo, Nuno Rafael e João Moreira. 

No seu álbum anterior, "Até Pensei que Fosse Minha", esteve declaradamente próximo de Chico Buarque, num álbum de versões do músico brasileiro com a participação do próprio. Neste disco, fala-se da influência de Caetano Veloso. Mas Tom Jobim foi também um dos anjos da guarda de "Do Avesso", o álbum mais orquestrado de Zambujo. O músico bejense, em entrevista à nossa rádio, concorda. António Zambujo entrou na música brasileira através de João Gilberto. "Depois do João Gilberto, veio o Vinícius de Moraes e o Tom Jobim, que é um pianista fantástico, um compositor incrível e um arranjador maravilhoso. As partes de arranjos e orquestra deste disco terão a ver com algumas coisas que foram ouvidas, um bocadinho da música anglo-saxónica mas também do Tom, com certeza". Não aprofundámos a conversa nas influências anglo-saxónicas, mas, por exemplo, 'Multimilionário' (composto pelo alentejano Jorge Benvinda dos Virgem Suta), parece ter o andamento de swing de Louis Armstrong.

 

O leque de compositores para António Zambujo costuma ser grande. Em "Do Avesso", o cantor dispõe uma rede transatlântica de canções, 14 originárias de tantas cabeças diferentes poderiam exigir mais tempo de maturação do que se viessem de três ou de quatro. Mas para Zambujo, isso não é problema. "Apesar de serem muitas cabeças, todas elas estão a pensar na mesma pessoa. Todos eles estão a fazer as músicas a pensar na minha forma de cantar. Já me conhecem bem e isso facilita bastante. É muito fácil fazer a seleção final precisamente por isso. Há um contexto, as músicas têm todas um sentido".

 

Como um Caetano Veloso a cantar 'Cucurrucucú Paloma', António Zambujo também resolveu investir no castelhano, interpretando 'Amapola' do músico de origem espanhola José María Lacalle. O músico não torce o nariz em vir a tornar-se mais multilingue. "Gosto das línguas latinas. Ainda não me aventurei no italiano. Já me aventurei também no francês. Na cena anglo-saxónica, não sei. Já participei naquele disco [de tributo] do David Bowie. Mas não tenho tanta confiança a cantar em inglês como tenho a cantar em espanhol. Não sei se no futuro isso melhorará. Mas no futuro, prefiro dar destaque ao português que é a língua mais bonita para ser cantada mas o espanhol vem logo a seguir". 

 

A propósito do título será que o avesso revela-nos mais que o que está à frente? "Revela. O título Do Avesso não fui eu que escolhi. Mas quem escolheu deu uma justificação que fez sentido na minha cabeça. Eram referências e influências musicais que já existiam mas que não estavam tão evidentes nos discos anteriores. Era como se fosse preciso virar do avesso para se perceber que lá estão. E de facto estavam". Porém, não significa para o cantor que os seus sete álbuns anteriores sejam menos pessoais.

 

António Zambujo é citado no press-release como dizendo que é aquilo que ouve. Mas aquilo que é passa a ser também aquilo que os outros tocam para ele. "Tudo o que soa, molda. Tudo o que entra na tua cabeça, enquanto músico, acaba por se moldar. O facto de terem entrado dois elementos novos na estrutura musical da minha banda vai acabar por moldar não só as músicas como a minha forma de cantar e a minha abordagem, sem isto querer dizer que sou influenciado. É uma coisa que acaba por acontecer naturalmente. A minha forma de cantar também vai moldar a forma de tocar deles"

 

Graças a Zambujo, Beja está mais carioca. Musicalmente, falando, claro. Pode até haver batucada, mas nada de viola campaniça à mistura, que não entra muito nos gostos do cantor. "Já me disseram que eu era o alentejano mais carioca do mundo. Mas não sei se Beja está mais carioca, até porque já não vivo lá há quase vinte anos. Não sei se terei grande influência na cidade onde nasci". 


Como alentejano de origem, António Zambujo já se associou a movimentos cívicos de indignação como o Beja Merece +, contra o isolamento cada vez maior da cidade do Baixo Alentejo. "Cada vez que vou a Beja, noto as coisas muito abandonadas. Uma estrada que foi começada e que não foi terminada já está em ruína, os terrenos abandonados". "O que eu vejo nas viagens que faço fora de Portugal, principalmente na Europa, como a aposta nos transportes públicos e no caminho-de-ferro, na descentralização - que se vê nomeadamente em Espanha e França - em Portugal parece que é tudo feito ao contrário. E não se explica porque não é feito. Não é claro. Ainda por cima, somos um país tão pequenino, era muito fácil a descentralização. Somos um grão de areia na Europa, comparado com Espanha ou França ou Alemanha?.

 

A ligação de António Zambujo ao Brasil é não só emocional e musical, como física, atendendo à regularidade com que se apresenta no país irmão. Mas será que Zambujo tem medo do Brasil do futuro Presidente Bolsonaro? "Não posso ter medo de uma coisa que não sei o que é. O que eu vi na campanha eleitoral é um certo sensacionalismo, quer da parte do Bolsonaro, quer da parte contra o Bolsonaro. O Bolsonaro não pode mudar as coisas sozinho. Existem uma constituição e uma série de coisas que protegem o país. Se não, qualquer louco poderia tomar conta. Sou positivo e tenho esperança que as coisas não são tão graves como se prevê. Assusta-me um bocadinho a forma como está a ser desmatada a Amazónia ou como o ambiente é tratado"

 

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